segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Menções Honrosas para Poema e Conto

POEMAS:

- "Olhares", de Paulo Olmedo.
 

Olhares



Olhos me observam.

Me vêem.
Me velam.
Eu me escapo, me fujo, escondo-me dos olhares alheios.
Ele se multiplicam,
me complicam,
querem saber o que faço,
por que faço,
buscar uma lógica na minha irracionalidade.

Eu me enervo,
desgosto,
detesto que me olhem.
Quando eu me olho,
no espelho,
não me vejo.

Ou vejo,
algo que não me remete,
mas me compromete,
talvez por tal e tanto, mesmo diante do meu espanto,
os olhos me olham, me cercam.

Mas antes que eu quisesse que tais e quais me olhassem eu pudesse,
nem que seja em uma prece,
me esconder, faria de tudo para poder
mesmo que insistissem
e se os olhos olhassem, torceria para que não me vissem.

Eu me perturbo, talvez desenganado
que os olhos que me vêem estejam olhando para o lado,
mas penso no fundo do âmago,
mesmo que seja engano,
que tantos quantos me observam, me velam, me esperam
e eu me desespero, inquieto e manso,
que até no meu mais profundo descanso,
alguém me quer olhar.

Imito Édipo e furo meus olhos para não ver tanto
que tais e quais e tanto e quanto
enquanto me concentro no meu breve espanto
de canto de olho talvez encontro um observador e tanto.

E me irrito, e insisto,
que me tiraram para cristo,
observando-me sinistro,
mesmo que eu não seja nem perto disto.

E resolvo abrir os olhos em pleno desalinho,
cansado do olhar vizinho,
talvez me achem mesquinho,
mas detesto o fixo olhar alheio em meio ao meu caminho
e faço força, entediado, de ao menos olhar pro lado
e descobrir,
embaraçado,
que me encontro sozinho.
 
- "Poema para Helena", de Paulo Tagliani

Poema para Helena

Da janela do apartamento

diviso as distantes luzes urbanas,

estrelas florianopolitanas

a refletirem-se no líquido espelho oceânico.
E nesse momento,
deteve-se meu pensamento,
como se entre uma hora e outra
abriu-se um espaço, um lapso de tempo,
sem futuro e sem passado,
e ali me reteve, docemente aprisionado
nesse encantamento,
até que suavíssimos beijos resgataram-me o presente
daquele momento profundo:
era a doce Helena
que trazia em seus lábios
o frescor da noite marinha
e em seus olhos, sua tez morena
toda a ternura do mundo.
 

- "Com o estetoscópio e o pêndulo", de Aline Cristina Calçada de Oliveira. 

Com o estetoscópio e o pêndulo



Ao auscultarmos o pulsar

Do coração de uma pessoa

Pelo estetoscópio
Podemos perceber
Cada som
Cada sopro de suas câmaras
O “Tum-tá” que tem intervalo
Ritmo, amplitude e movimento
Mas se utilizarmos nossos corações
Nossas mãos e um pêndulo
Podemos vislumbrar os chacras                       
E com eles
O badalar além do tempo
E sentir um som uníssono
Da pulsão do Universo
Nos fluxos de seus vórtices
Num devir infinitamente bendito
Na virtualidade da vida
Onde a criação acontece
Agora e agora...
 
 CONTO:

- "No trem", de Rosane carvalho.


No Trem



Já estava no trem, desses que levam a gente de um estado para o outro, no interior do Brasil. O meu destino era a casa de meus pais, após alguns meses sem vê-los devido ao meu trabalho, que faz com que eu passe um longo período no litoral. A viagem era tranquila, e eu contemplava o cenário pela janela. Em certa estação, ainda faltando umas três horas para eu chegar a meu destino, subiu um senhor e sentou ao meu lado, depois de me cumprimentar de uma maneira alegre como se faz com uma pessoa que se quer bem, dizendo que a viagem era longa e sentaria ali para conversarmos, já que “ha tempos não me via”. No início pensei que ele havia se confundido, achando que eu fosse outra pessoa. Mas quando me chamou pelo nome, percebi que não se tratava de um estranho. No início, fiquei meio sem graça, por não lembrar dele, na realidade parecia nunca te-lo visto antes.  Então ele começou a me falar de sua doença e as custosas viagens para o tratamento.  A conversa seguiu e ele perguntou por meu pai, sabia até de seu problema no rim, que o acompanha há muitos anos. Depois falamos de meu tio e sua criação de codornas,...e assim prosseguimos a viagem. Aquele homem, com uma conversa de quem realmente conhecia meus familiares. A cada assunto que ele trazia, percebia que era íntimo conhecido da família. Sabia também de mim, das minhas travessuras quando criança, de quando decidi sair de casa para ir cursar a faculdade e viver em uma cidade maior. Até meu emprego atual não era novidade para ele. Falava com a simplicidade de homem do campo, e eu, ao mesmo tempo que participava da conversa, intrigado, em meus pensamentos, me perguntava: quem será essa pessoa? Fiz um esforço para lembrar, reparei na sua maneira de falar, no seu jeito, ao mesmo tempo em que procurava na memória, algum vestígio de lembrança, mas nada encontrei! No início, meio surpreso, fui respondendo, achando que no caminho me lembraria. Depois até achei engraçado, falar com alguém que parecia nunca ter visto e que sabia tanto de mim! Mas a cada assunto me surpreendia com  seu conhecimento sobre minha vida. E, a cada pausa na conversa, ficava pensando uma maneira menos constrangedora de identificá-lo, para saber de quem se tratava, ou pelo menos pegar uma pista para falar aos meus pais. O seu nome, ou de algum parente, local onde morava...qualquer pista seria preciosa, mas nada! Eles certamente saberiam de quem se tratava. Mas como perguntar por alguém de sua família? Não sabia com quem morava, nem se tinha filhos.

O trem já se aproximava da última estação antes da minha, faltando meia hora para eu chegar, meu companheiro de viagem disse que era nesta que ele ficava, mandou lembranças para todos, falou para eu aproveitar a minha estada e aparecer com meus pais para visita-lo. Então como ultima chance de saber de quem se tratava, na esperança de encontrar algo como referência pra saber com quem eu conversava, ou dele falar um nome de um conhecido que fosse seu parente, falei:  Passou tão rápido, nem mesmo deu tempo do senhor contar dos seus, e como eles vão? E ele, na sua simplicidade, já levantando do banco disse: ah! Por aqui, sempre sem novidade, tudo bem, todos tocando a vidinha de sempre!

Ele desceu do trem e eu fiquei sem referencia do cidadão! 
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Um comentário:

  1. como seria interessante, poder ao longo das estações da vida, escutar vozes intimistas, sem serem intimidatórias... vozes faladas no interior mas que precisam que o outro lhes confira credibilidade....
    e quem é esse misterioso interlocutor? oras....esse outro viaja no mesmo trem, sobe ou desce na estação que tu quiseres...

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